Tal esticou a mão e se ergueu até a próxima ponta de ferro da Torre Vermelha. Parou para tomar fôlego e olhou para baixo, em direção às luzes cintilantes que contornavam as principais edificações do Castelo. Elas estavam muito longe, e a altura o deixou meio tonto. Rapidamente ele olhou de novo para cima.
O vento era muito mais forte do que imaginara. Uivava ao redor da Torre Vermelha e, em seguida, rodopiava pelas outras seis torres antes de voltar ainda mais forte. Estava esfriando muito, e a escalada tornava-se cada vez mais difícil. Mas a Pedra-do-Sol de Tal fazia o frio ser suportável.
Tal demorou duas horas para subir até o lugar onde agora descansava - uma escalada difícil, por entre as pontas de ferro, gárgulas e incrustações que cobriam a torre. Agora, estava a apenas quatro trechos do ponto onde a torre parecia terminar repentinamente, de encontro ao manto de escuridão total que se estendia pelo céu.
Era o Véu, a estranha barreira que mantinha o mundo todo nas trevas, impedindo a entrada da luz do sol.
Não que estivesse completamente escuro ao redor de Tal. Como na maior parte do Castelo, a Torre Vermelha era iluminada por pequenas Pedras-do-Sol presas nas paredes e nos tetos. A luz dessas Pedras-do-Sol saía pelas janelas, e assim Tal conseguia enxergar por onde subir. As outras seis torres também resplandeciam com a luz, em feixes brilhantes cruzando o céu.
A luz produzia muitas sombras bruxuleantes do lado de fora. Todas as gárgulas e bordas decorativas projetavam uma sombra escura sobre o vermelho ocre da torre. E havia também a própria sombra de Tal. Como acontecia com todos os Escolhidos do Castelo, ela não reproduzia a forma de seu corpo. A sombra que se movia junto com ele fluía e se transformava. Às vezes tinha a forma comum de um garoto de treze anos, às vezes parecia um gato ou um Corvil de duas cabeças, ou alguma coisa tão fluida que não era possível descrever.
Pois a sombra de Tal não era aquela com que ele tinha nascido. Era uma sombra-guardiã, uma criatura mágica de Aenir, o reino dos espíritos. Havia sido destinada a Tal quando ele nascera, para substituir a sua sombra natural e era encarregada de protegê-lo e ajudá-lo. Isso era muito bom, pensava Tal, afinal já era bastante ruim ver no espelho o seu corpo desengonçado e seu cabelo desgrenhado. Sentia-se aliviado por não ter uma sombra deles seguindo-o por toda parte.
A sombra-guardiã não mostrava que Tal era menor do que a maioria dos outros garotos de sua idade. Ou que seu sorriso ligeiramente torto fazia, achava ele, com que parecesse um pouco estúpido. Ninguém pensava assim, mas isso incomodava Tal. Costumava ficar horas se exercitando em frente ao espelho, tentando endireitar aquela crispação do lado esquerdo.
Ele não se importava que a sombra-guardiã fosse apenas um dos espíritos mais fracos de Aenir, um servo de criança. Quando completasse treze anos e três quartos, dentro de dois meses, ele próprio iria entrar em Aenir e capturar um verdadeiro Espírito-Sombra para servi-lo.Isso, se fosse capaz de entrar em Aenir.
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